'Como temos visto ao longo dos anos, o MEC tem se mostrado cada vez mais autoritário, impondo o que bem entende à Educação'', diz Roberto Boaventura da Silva Sá, doutor em Jornalismo
* ROBERTO BOAVENTURA DA SILVA SÁ
Oficialmente o carnaval acabou. Baterias estão em silêncio. Carros alegóricos, estacionados. Ardentes bundas, brancas e negras – ou euro e afro-descendentes –descansam das mexidas e remexidas. Abundância à brasileira! Após mais um carnaval, eis o miúdo do cotidiano, cada vez mais imerso em cinzas e sem as máscaras para atenuarem o real de colombinas e pierrôs iludidos.
Assim, volto à carne fria de meu artigo anterior, no qual expus uma das maiores aberrações na Educação; e olhem que os absurdos não são poucos e tampouco rasos. Naquele artigo, condenei a premiação e a condecoração que o MEC e o Inep ofereceram a corretores de redações do Enem/2010. A vencedora afirmou que fazia tal atividade, destinando apenas dois minutos para cada texto. Impossível.
Como temos visto ao longo dos anos, o MEC tem se mostrado cada vez mais autoritário, impondo o que bem entende à Educação. Não tem respeitado sequer a história de luta das universidades, consolidada durante a ditadura militar/64. Às universidades, o MEC faz graves imposições atenuadas por solenidades e propagandas oficiais: PROUNI, REUNI, Enem etc. Para isso, coopta mentes que num passado foram de resistência a qualquer autoritarismo.
Algumas das mentes são compradas com dinheiro vivo: algo material que se pode esfregar no nariz de alguém e alhures. Outras, com cargos. Muitas, apenas com a força da ideologia: algo que pode até não ter bom cheiro, mas que é vendido como se fosse perfume francês; e em frascos minúsculos. Impressionante!
É por isso que as universidades ficaram em silêncio também diante dessa premiação/condecoração do MEC aos corretores do Enem. De minha parte, continuo denunciando, mas acompanhado cada vez mais de menos professores. Nesse caso em particular, incomoda-me o silêncio de colegas – alguns muito sérios – que por anos lidaram com as atividades pertinentes à redação de vestibulares.
O silêncio desses docentes ajuda na abrangência do desrespeito à juventude inteira; é um desserviço à nação. Pior: para ficar na visão umbilical de mundo, essa atitude demonstra desdém aos seus próprios filhos, netos, bisnetos.... O silêncio sempre foi opção pela omissão. A omissão é opção política; aliás, tão perversa quanto covarde. Ela jamais deveria ter espaço numa universidade; mas tem.
No caso da UFMT, sua reitora – que colaborou com o MEC na “adesão” do Enem – é uma docente privilegiada no quesito redação. Sua formação é em Letras. Foi docente da área de Língua Portuguesa. Por isso, desafio academicamente minha Magnífica colega a provar o contrário, quando afirmo que corrigir redações no tempo declarado/premiado pelo MEC é impossível; que é desrespeito ao jovem que de fato se prepara para a escritura de um texto.
Numa equivalência profissional, que aliás sempre estabeleço em minhas aulas de Literatura, ninguém crê numa consulta médica em dois minutos; ou crê? Agora, com a palavra o Magnífico vice-reitor, que é um respeitado médico/doutor. A atitude respeitosa para com o ser humano (aluno/paciente) deve ser a mesma em ambas as situações; ou não?
Feito o desafio, se conseguirem me convencer do contrário de minhas convicções profissionais, ótimo. Pedirei desculpas. Se não, como docente, também formado em Letras, e que labuta e sua para escrever seu artigo toda semana, espero que a UFMT revise a adesão ao desacreditado ENEM. Portanto, o desafio acadêmico está lançado publicamente. Espero que esse diálogo não seja transformado em monólogo, como em outros momentos idos.
* ROBERTO BOAVENTURA DA SILVA SÁ - Dr. em Jornalismo/USP e Prof. de Literatura da UFMT
rbventur26@yahoo.com.br
Fonte: Diário de Cuiabá (MT)
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