terça-feira, 25 de outubro de 2011

Ciência e educação

Artigo de Ruy Martins Altenfelder Silva publicado no Correio Braziliense de hoje (24).

É fácil notar certo deslumbramento com o crescimento econômico e a importância que o Brasil vem ganhando no cenário internacional. Com a crise econômica na zona do euro e a instabilidade político-econômica nos Estados Unidos, o mundo passou a olhar com atenção para as perspectivas promissoras dos países do Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). Mas aqui volta e meia impõe-se uma velha dúvida: até que ponto a nação está preparada para desempenhar o tão sonhado protagonismo mundial? Sétima economia mundial, com potencial para subir no ranking nos próximos anos, o Brasil permanece num modesto 13º lugar no tocante à produção científica. Mais negativo, ainda, é o dado sobre a corrida pelas patentes, indicador de inovação científica e tecnológica de um país. Segundo o Relatório Mundial da Ciência da Unesco, a participação brasileira não passa de 0,1% do volume mundial.

A ciência é a base para o desenvolvimento social, político e econômico de uma nação. A palavra vem do latim - scientia significa conhecimento - e faz parte do esforço de descobrir e aumentar o conhecimento humano sobre a própria realidade, com o objetivo final de trazer bem-estar, resolvendo as mazelas da sociedade. Portanto, está intimamente ligada à educação de qualidade, sem a qual não existe. Sem ciência, não há desenvolvimento. Portanto, é legítimo concluir que, sem educação de qualidade, não há inovação nem desenvolvimento sustentável.

Em contraponto aos indicadores saudáveis, a conjuntura atual revela perigosos efeitos da ausência de um sistema educacional organizado e apto a formar as novas gerações - tanto para o trabalho quanto para o exercício pleno da cidadania, com seus direitos e deveres. Um dos mais preocupantes é a falta de mão de obra qualificada para dar sustentabilidade ao desenvolvimento, um gargalo já perceptível em poucos anos de retomada do crescimento. Faltam profissionais de tecnologia da informação (TI) nas empresas que atuam em setores de ponta. Faltam professores para o ensino das ciências no nível básico, em matérias fundamentais, como matemática, física e química. Faltam engenheiros civis para o boom da construção civil e para tocar os projetos de modernização da infraestrutura do País. E por aí vai.

A carência de profissionais qualificados pode parecer um problema distante dos bancos escolares do ensino básico. Mas não é. Para que o país cresça de forma sustentável, é necessário investir em educação de qualidade desde os primeiros anos de aprendizado e, gradativamente, abrir espaço para cursos que se aproximem das demandas dos setores produtivos, em especial os estratégicos para o desenvolvimento nacional. Paralelamente, há que se estimular a produção científica, diminuindo a burocracia e aumentando os recursos destinados à pesquisa e ao desenvolvimento (P&D). Nos Estados Unidos, 76% desses investimentos vêm da iniciativa privada. No Brasil, a maioria dos recursos sai dos cofres públicos e o investimento é tímido, se comparado aos indicadores mundiais. O Brasil investe em torno de 1,5% do Produto Interno Bruto (PIB) em P&D, inferior à média de 2,28% dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Os dados do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa) situam o Brasil entre os piores países do mundo em desempenho escolar, atrás de países como Bulgária e Romênia, e dos latinos México, Chile e Uruguai. Um dos fatores para esse péssimo resultado é a chamada educação recorrente. Como no nível anterior o aluno não aprendeu o que deveria, o nível seguinte é prejudicado e assim segue, até se chegar ao nível superior com enormes lacunas de conhecimento a serem recuperadas, o que quase sempre não acontece.

O descaso com o ensino parece já estar embutido em largos círculos da própria sociedade. A começar pela desvalorização do professor, vítima de desrespeito por parte dos alunos e suas famílias, das deficiências da gestão escolar, dos baixos salários, da carência de programas de reciclagem e treinamento - para ficar em apenas um dos aspectos do problema. Mas, felizmente, ainda há muitos mestres dedicados à nobre vocação de ensinar. É para homenagear esses heróis da sala de aula que o CIEE criou, há 15 anos, o prêmio Professor Emérito - Guerreiro da Educação. Neste ano, a homenageada é a médica Angelita Habr-Gama, coloproctologista que se destacou como professora titular da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e, por suas pesquisas pioneiras, tornou-se referência mundial em sua especialidade. Generosa, destinou parte das atividades a difundir seus saberes, formando várias gerações de médicos especialistas. Aos 80 anos, continua na ativa e agora ingressa na galeria dos Guerreiros da Educação, que já conta com colegas homenageados em anos anteriores: Adib Jatene e Luiz V. Decourt, mestres e inovadores reconhecidos na área de cirurgia cardíaca. Lição exemplar de amor ao ensino e à ciência, digna de ser transmitida às novas gerações.

Ruy Martins Altenfelder Silva é presidente do Conselho Diretor do CIEE Nacional e do Conselho de Administração do CIEE, presidente da Academia Paulista de Letras Jurídicas.

Inovar para competir

Artigo de Roberto Rodrigues na Folha de São Paulo de sábado (22).

Tenho insistido muito neste espaço em valorizar a tecnologia como principal fator responsável pelo extraordinário salto da produtividade e da competitividade sustentável da agropecuária brasileira. E é mundialmente reconhecido o papel da Embrapa nesse processo. De fato, essa notável instituição ainda é muito jovem - nem completou 40 anos - para os avanços obtidos - a conquista do cerrado se insere no rol dos mais relevantes. Com efeito, até a década de 1970 os produtores rurais diziam: "Cerrado, só dado ou herdado!".

Eles sabiam como era fraca a terra de lá e, muito antes da Embrapa, o Instituto Agronômico de Campinas, a Esalq de Piracicaba e instituições de pesquisa paulistas e de outros estados vinham estudando formas de domar aquela natureza hostil à agricultura. Mas, vitimada pelo célebre erro de Pero Vaz de Caminha ("Nesta terra, em se plantando tudo dá"), a sociedade em geral acha que a maior moleza no Brasil é ser agricultor. Não é. Nunca foi.

É verdade que as chamadas terras roxas de Ribeirão Preto, de Jaú e do norte do Paraná ou o massapé de Campinas e de Piracicaba vinham sendo cultivados com grande êxito graças aos trabalhos de pesquisa e extensão rural de órgãos públicos paulistas.

Mas o solo do cerrado, essa imensa área que representa a nossa maior fronteira agrícola, é o tal latossolo, com coloração que vai do vermelho ao amarelo, profundo, bem drenado, muito pobre em nutrientes essenciais (cálcio, magnésio, potássio) e matéria orgânica, tem grande acidez e toxidez por alumínio, de modo que, sem tecnologia adequada e corretivos e fertilizantes, não produz nada! Bem diferente, por exemplo, do pampa argentino, planícies férteis conhecidas como os melhores solos do mundo, que precisam de menos da metade dos adubos de que precisamos.

Por outro lado, grande parte do nosso cerrado, da metade do Centro-Oeste para cima, tem um clima chamado de tropical sazonal, que se caracteriza por um limitado período de chuvas durante o verão e um inverno sequíssimo, que não permite duas culturas anuais.

Pois foram essas dificuldades naturais aparentemente insuperáveis que nossos cientistas venceram, trazendo para cá tecnologias desenvolvidas em países do hemisfério Norte e tropicalizando-as, seja com variedades adaptadas à nossa edafoclimatologia, seja com tratos culturais modificados, seja com fertilização diferente e até com a irrigação apropriada. Os solos drenados do cerrado não retêm a umidade, de modo que secam rapidamente. E sua acidez inibe qualquer cultivo.

Tudo isso foi enfrentado e dominado pela tecnologia. Cada pesquisador do nosso agro merece uma medalha! Hoje, competimos com produtores do mundo todo, e, mesmo com o pesado custo Brasil, avançamos no mercado internacional. Só em relação às exportações, saímos de US$ 21 bilhões em 2000 para mais de US$ 74 bilhões no ano passado. E com um saldo muito maior que o saldo do País todo, salvando com isso até nossas reservas em dólares.

E novas tecnologias vêm chegando: a integração lavoura-pecuária, verdadeira revolução tropical, por exemplo, permite em toda região de inverno seco duas culturas anuais: grãos e carnes. Um verdadeiro ovo de Colombo.

A biotecnologia, a nanotecnologia, as novas máquinas agrícolas que reduzem perdas, os defensivos com moléculas muito menos agressivas, as sementes mais resistentes e rústicas, a irrigação, as biorrefinarias e um sem-número de outros temas que nos colocam na vanguarda do conhecimento científico no agro são garantia de contínua competitividade com sustentabilidade, mesmo se confirmarem as previsões mais pessimistas quanto ao aquecimento global: a gente se adaptará!

Por isso, é absolutamente fundamental oferecer aos nossos institutos de pesquisa - IAC, IB, IZ, Pesca, Universidades, Embrapa - e de extensão - a Cati - os recursos indispensáveis para continuarem servindo ao País.

Roberto Rodrigues é coordenador do Centro de Agronegócio da FGV, presidente do Conselho Superior do Agronegócio da Fiesp e professor do Departamento de Economia Rural da Unesp - Jaboticabal, foi ministro da Agricultura (governo Lula).

Estudo da Academia Brasileira de Ciências (ABC) diz que Brasil usa métodos ineficazes para alfabetizar

Lançamento de livro sobre educação infantil acontece em seminário internacional promovido pela FGV.

Amanhã (26), será lançado livro com as conclusões de cinco anos de estudos do Grupo de Trabalho sobre Educação Infantil, criado pela Academia Brasileira de Ciências (ABC) em 2007. O lançamento acontece durante seminário internacional promovido pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), que traz uma pauta focada em alfabetização, um dos principais temas do grupo e um dos maiores problemas da educação brasileira.

Integrado por especialistas em aprendizagem de diferentes áreas: neurociências, psicologia cognitiva, economia, o GT passou anos compilando estudos internacionais e analisando as mudanças nas diretrizes de políticas de alfabetização de diferentes países que alteraram suas estratégias nessa área em função dessas evidências científicas. Entre eles França, Inglaterra, EUA, Austrália, Israel e Finlândia.

De acordo com a publicação, o Brasil usa métodos de alfabetização superados, cuja ineficácia já foi exaustivamente comprovada por inúmeros estudos científicos internacionais, que vêm orientando há duas décadas profundas mudanças nas políticas de alfabetização de diversos países. Os métodos fônicos, baseados em instruções explícitas sobre a relação entre grafema (letra) e fonema (som), são, segundo esses estudos, os que apresentam melhores resultados quando se trata de alfabetizar. Outra constatação científica que contradiz as práticas brasileiras diz respeito a idade para alfabetizar. As pesquisas indicam que seis anos é a idade ideal, na qual essa aprendizagem é mais fácil.

Seminário - O relatório do grupo, que inclui ainda estudos sobre o desenvolvimento infantil em idade pré-escolar, será lançado pela ABC durante seminário internacional promovido pela FGV. O encontro contará com a presença do prêmio Nobel de Economia, James Heckman, autor de um estudo que mostra que a taxa de retorno (tanto em termos de desenvolvimento e renda dos indivíduos como das nações) obtida pelos investimentos em educação é tanto maior quanto mais precoce a faixa etária focada por esses investimentos.

Este é o quarto seminário científico internacional realizado no Brasil este ano que apresenta conclusão similar sobre a alfabetização no Brasil. O primeiro, promovido pela Pontifícia Universidade Católica (PUC) em São Paulo reuniu 50 palestrantes de vários países. Apesar disso, o que ainda se ouve no Brasil é "esta polêmica entre construtivistas e defensores do método fônico não tem nada de novo; está provado que método não tem importância, o que conta é a competência do professor".

Não é o que dizem os levantamentos de estudos científicos feitos pelos governos de vários países e agora compilados pelo grupo da ABC. O mais grave é que os estudos constatam que o uso de métodos de alfabetização ineficientes tem impacto negativo muito mais forte sobre as crianças de classes socioeconômicas mais baixas.

O professor João Batista Oliveira, psicólogo especialista em educação e presidente do Instituto Alfa e Beto (IAB) apresentará no seminário as conclusões do grupo de estudo na área da alfabetização.

O tema é bem oportuno. Afinal, na última avaliação de leitura do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa, de 2009), o Brasil ficou em 54º lugar num ranking de 65 países, atrás de nações como Sérvia Romênia e Trinidad Tobago. O exame, que analisa a capacidade de leitura de estudantes de 15 anos da rede pública, concluiu que a maioria deles no Brasil apenas identifica palavras ou frases simples, não sendo capazes de compreender textos. Numa classificação de 1 a 5, em que 5 equivale à leitura fluente e 1 à capacidade de identificar palavras, a média nacional (de alunos de 15 anos!) ficou em 2, mas com grande contingente no nível 1, que é onde teria ficado a média global caso tivessem sido considerados apenas os meninos. Segundo a Prova Brasil, metade dos estudantes de 5º ano são analfabetos.

Inovação e empresas

Artigo de Eloi S. Garcia enviado ao JC Email pelo autor.

O setor produtivo brasileiro ainda está engatinhando na cultura da inovação. Temos poucos exemplos de Universidades e Institutos de Pesquisa que atraem o empresariado nacional, em busca de pesquisa, processos e projetos inovadores e rentáveis para o mercado. Nosso sistema de inovação é frágil por sua estrutura empresarial e pela capacitação setorial, dominadas geralmente por empresas grandes, que fazem o desenvolvimento tecnológico fora do país. Sem empresas não há inovação.

Há muitas formas de considerar a inovação. Inovar não é somente utilizar a alta tecnologia. Às vezes uma nova interpretação de algo antigo ou o uso de um método velho de maneira inteligente são mais inovadores que um novo material ou uma tecnologia sofisticada. Inovar é também a capacidade de colocar um produto já conhecido, tornando-o de qualidade melhor e mais barato do que o original e aceito pelo comercio. Inovar é desenvolver novos produtos e processos a capacidade de chegar a um futuro planejado de maneira clara e produtiva. Inovar não é uma alternativa, é o caminho. Assim, o conceito de inovação deve ser ampliado, utilizando-se tanto para a inovação empresarial como a inovação social. Se mudar a cultura e desenvolver a criatividade surgirão caminhos alternativos para a evolução do setor.

A inovação, medida pela passagem da invenção de certo produto, sua inovação e utilização, tem sido cada dia mais rápida. A bateria de carro foi descoberta em 1780 e utilizada em 1859; a lâmpada foi descoberta em 1802 e passou a ser útil para a humanidade em 1873; o zíper (que usamos em nossas roupas) foi descoberto em 1891 e utilizado em 1923; Santos Dumont voou pela primeira vez no 14 bis em 1906 e em 1969, Armstrong pisou na lua; a penicilina foi descoberta em 1922 e sua utilização começou em 1941, durante a segunda guerra mundial; o transistor for descoberto em 1940, e passou a ser um bem para a humanidade em 1950; e agora, o coquetel para tratamento da AIDS que em poucos meses passou a ser útil para a sociedade. Este é o mundo em que vivemos, este é o planeta que temos que compreender.

O bom entendedor sabe que a inovação não é espontânea, não nasce do nada. Somos um país rico em cérebros, mas que não tem a cultura e a tradição de levar os descobrimentos ao mundo das empresas. Os temores e suspeitas nos levam a pensar de que criar uma empresa inovadora é muito difícil. Inovação também é risco. Mas algumas empresas de inovação interpretam a crise como uma oportunidade. Para que nosso País tenha uma economia sustentável e seja forte e internacionalizada, devemos alcançar uma balança tecnológica positiva baseada na inovação e no conhecimento e que seja capaz de atrair, reter talentos e gerar empregados de alto valor agregado.

A inovação requer uma estratégia política de Estado, e não de Governo. Esta política envolve a área de educação, a ciência e tecnologia, a indústria e o comércio, a relação público-privado, um forte planejamento que permita estabelecer as "regras do jogo" para os anos vindouros e fomente a produtividade. Esta estratégia da inovação deverá afetar numerosos elementos da sociedade entre os quais se podem citar: a percepção social da inovação, a valorização do êxito empresarial-tecnológico, a valorização do fracasso para não inibir as novas ideias e os mecanismos de defesa da propriedade intelectual. Sem estes pontos não haverá inovação.

Eloi S. Garcia, ex-presidente da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), é pesquisador do Instituto Oswaldo Cruz (Fiocruz), assessor da Presidência do Inmetro, e membro da Academia Brasileira de Ciências.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Ainda em obras, novas federais já têm 10% dos alunos



Mais de 40 cidades, a maioria do interior do País, entraram no mapa do ensino superior público desde 2005, com a ampliação e a abertura de 14 universidades federais, distribuídas em mais de cem campi.

Se a infraestrutura ainda é um problema, o número de alunos tem crescido. Desde o primeiro ano letivo de funcionamento das novas universidades em 2006 até hoje, as matrículas saltaram de 25 mil para mais de 80 mil, fatia de quase 10% de todas as vagas na rede de ensino superior federal, que conta hoje com 59 instituições.

No período, a concorrência do vestibular também cresceu. Na Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre, que passou por ampliação em 2008, a relação candidato/vaga para medicina é de 59,3. Na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) o mesmo índice é de 45,3; na Universidade de São Paulo (USP) a concorrência é de 67 vestibulandos para cada vaga. Como em outras universidades, a procura é baixa nos cursos de licenciatura.

O processo seletivo via Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) para o bacharelado interdisciplinar (BI) de ciência e tecnologia da Universidade Federal do ABC (UFABC) foi o mais disputado do país este ano, com a marca de 11 alunos por vaga. O que atrai o aluno é a proposta de grade curricular livre do bacharelado, que oferece formação geral nos três primeiros anos seguida de uma especialização. Primeira a implantar o projeto pedagógico em 2005, ano de sua fundação, a UFABC já "exportou" o modelo para outras 14 universidades e colabora na implantação do bacharelado interdisciplinar em instituições particulares.

Esse modelo se propõe a integrar conhecimentos na formação inicial do aluno e reforçar o estudo específico na parte final. Na UFABC, a ênfase dos bacharelados está nas engenharias e no curso ciências da computação, estratégia que atende a demanda por mão de obra qualificada nas indústrias do ABC paulista. "Tenho vários colegas estagiando em grandes empresas, como Siemens e ABB", conta Marco Camargo, aluno da UFABC.

A oferta de cursos de graduação nas novas universidades foi pensada conforme a localização e as principais características para o desenvolvimento regional. No interior do Rio Grande do Norte, as graduações de agronomia e engenharia do petróleo da Universidade Federal do Semi-Árido estão associadas ao forte mercado agrícola e aos projetos da Petrobras na região. Instalada em diversos campi espalhados pelo interior do Rio Grande do Sul, Paraná e de Santa Catarina, a nova Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) foi criada a partir da demanda de movimentos sociais e de prefeituras.

Em Santarém, todos os cursos oferecidos pela Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), aberta em 2009, têm abordagem relacionada à floresta amazônica. "Hoje há carência profissional na região nos projetos de geração de energia, por isso formatamos nossas engenharias para contemplar manejo florestal e aspectos hídricos específicos. Temos a maior bacia hidrográfica do planeta, mas nunca tivemos cursos específicos. Criamos os programas de piscicultura e aquicultura, áreas que poderiam ter um mercado forte de exportação se produzisse em grande escala", diz José Oliveira Aquino, pró-reitor de ensino da Ufopa.

O maior problema da expansão das universidades federais é a infraestrutura. Sem exceção, as 14 novas instituições são verdadeiros canteiros de obras e a grande maioria apresenta atraso nas construções, o que implica em salas de aula improvisadas, ausência de laboratórios adequados e uma lista de precariedades no serviço cotidiano, como problemas na biblioteca, na moradia estudantil, restaurante universitário.

De acordo com monitoramento do Ministério da Educação (MEC), o projeto de expansão de toda a rede federal demanda uma área construída de 3,5 milhões de metros quadrados, com mais de 30 obras paradas atualmente. "Já foram entregues 1,6 milhões de metros quadrados, mas estamos monitorando os atrasos, que ocorrem por causa de problemas de cumprimento de contrato por parte das empreiteiras", justifica Luiz Cláudio Costa, secretário de ensino superior do MEC. "Saímos de um patamar muito baixo, com orçamento limitado e sem capacidade operacional. As universidades tiveram que reaprender a investir, reorganizar seus setores de engenharia, de compras. Os transtornos são legítimos, mas precisamos resolver", completa.

Desde o início do ciclo de expansão do ensino superior federal, o orçamento de toda a rede cresceu 94% em valores correntes, de R$ 12,5 bilhões em 2006 para R$ 24,2 bilhões este ano, segundo lançamento na Lei Orçamentária Anual (LOA). Em igual período, os recursos das 14 novas instituições registrou alta de 370%, saindo de R$ 404 milhões para R$ 1,9 bilhão.

(Valor Econômico)

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Quanto menor a criança, menor deve ser o tempo on-line

Para especialistas, computador não pode substituir brincadeiras e tarefas infantis.

"O João Pedro acha que a vida é touchscreen, tenta controlar tudo tocando na tela e nem olha para o teclado." É assim que a engenheira Katia Ferreira, 40, fala da relação de seu filho caçula, de 4 anos, com o mundo digital. O interesse de pequenos como João Pedro pela tecnologia suscita a pergunta: há idade mínima para uma criança ter seu primeiro computador?

Para o psicólogo Rodrigo Nejm, da ONG Safernet Brasil, a resposta passa primeiro pela avaliação dos pais sobre a maturidade do filho: "O importante é nunca perder de vista que o computador te conecta à maior praça pública do planeta, que é a internet". "E, como você não deixaria seu filho sozinho na rua, não deve deixá-lo sozinho na internet", acrescenta Nejm.

O professor Nelson Pretto, que estuda educação e tecnologia na Universidade Federal da Bahia (UFBA), concorda que esse acompanhamento é necessário até que a criança tenha compreensão de que a internet oferece riscos. Mesmo com a ressalva, ele destaca a importância do uso dos recursos eletrônicos pelos pequenos.

"A tecnologia tem um papel fundamental na formação das crianças. Formamos nossos jovens para viver no mundo contemporâneo. E esse mundo é cercado de tecnologia", defende Pretto.

E, mesmo que o filho tenha o próprio computador, os pais devem sempre tentar monitorá-lo on-line.

Ao alcance da vista - Nesse sentido, Nejm recomenda deixar o computador na área comum da casa. Para ter computador no quarto, "somente a partir de uns 10, 11 anos, após ter sido acompanhada pelos pais desde os cinco, seis", indica.

Os especialistas ressaltam que não há uma idade mínima para usar computador, mas chamam a atenção para o equilíbrio entre as atividades da criança. "O computador deve ser usado para somar, e não para substituir as brincadeiras e obrigações infantis. Se ela só quer ficar no computador, não sai de casa, não brinca com outros garotos, certamente essa relação está sendo prejudicial", alerta Nejm.

Uma hora por dia - Para Pretto, "quanto menor a criança, menor deve ser o tempo para ela usar o computador". Na avaliação dele, o ideal é não passar de uma hora por dia até ao menos os dez anos de idade. A arquiteta Sabrina Zenario, 37, tem tudo isso em mente quando sua filha Catarina, 6, pede para visitar o site da Barbie, seu preferido. "Estou sempre junto. Ela só usa com a supervisão de um adulto".

O computador que elas usam fica na sala e, oficialmente, pertence a toda a família. Mas Catarina tem outra opinião. "Ah, ela sempre diz que o computador é dela", reconhece a mãe.

(Folha de São Paulo - Leia mais sobre o assunto no caderno TEC)

Nobel de Química vai para cristal que "não devia existir"

Israelense mostrou que estrutura cristalina pode ser formada por padrões complexos que nunca se repetem.

Os meticulosos cadernos de laboratório do israelense Daniel Shechtman permitem datar com precisão a descoberta que acaba de render a ele o Prêmio Nobel em Química deste ano. Foi na manhã de 8 de abril de 1982 que ele usou uma série de pontos de interrogação para marcar sua surpresa com o que estava vendo no microscópio: um cristal que não deveria existir.

Para o comitê do Nobel, ele "modificou a concepção fundamental do que é um objeto sólido", mostrando que os átomos podem se organizar em estruturas de grande complexidade, que não se repetem. Por isso, embora o achado ainda tenha pouca aplicação prática, ele foi considerado digno do prêmio.

Para Nivaldo Speziali, presidente da Sociedade Brasileira de Cristalografia, o ganhador mostrou "que a periodicidade estrutural [a repetição regular das mesmas estruturas] não é necessária na definição de cristal". Há exemplos de materiais artificiais e naturais com os quasicristais (como são chamados) do israelense. A arte medieval bolou estruturas parecidas.

Teimosia - Shechtman precisou de muita persistência, pois a grande maioria dos cientistas duvidou de seus achados. Um deles era Linus Pauling, ganhador do Nobel em 1954, conta Speziali. Por conta das reações negativas, o israelense chegou a ser expulso do laboratório onde trabalhava nos EUA. Hoje ele está no Instituto de Tecnologia de Israel, em Haifa.

Em entrevista dada ao comitê do Nobel, Shechtman disse que sua descoberta lhe ensinou que "o bom cientista é humilde a ponto de estar disposto a considerar novidades inesperadas e violações de leis estabelecidas".

Os quasicristais descobertos são, em sua maioria, criados artificialmente quando uma liga metálica derretida é esfriada rapidamente em uma superfície giratória. Sua estrutura tridimensional dificulta a propagação de ondas, o que define suas características peculiares. Eles são maus condutores de calor e de eletricidade, têm baixa fricção e aderência, mas são altamente resistentes e, por isso, prometem grande aplicabilidade.

Seriam bons para aço reforçado, lâminas e agulhas cirúrgicas, frigideiras e motores a diesel. Mas poucas aplicações concretas já foram desenvolvidas devido ao alto custo de produção deles. Arte islâmica já trazia padrões dos quasicristais

AIQ - O ano de 2011 é celebrado como o Ano Internacional da Química, e o Prêmio Nobel em Química dado a um físico coroa o aspecto interdisciplinar da área. A descoberta dos quasicristais, por exemplo, tem relações com a física, com a engenharia de materiais, com a matemática e até com as artes não figurativas, sem falar na própria química, é claro. O padrão não repetitivo presente nos quasicristais tem raízes matemáticas antigas. A razão das distâncias entre os átomos nesses materiais está sempre relacionada à proporção áurea, descrita pelo matemático Fibonacci no século 13 e conhecida já na Antiguidade.

Na década de 1970, Roger Penrose usou a proporção áurea para produzir mosaicos aperiódicos, imagens compostas de combinações de formas geométricas que são infinitamente variadas. Os mosaicos da arte islâmica medieval, como o do palácio de Alhambra, na Espanha, também têm o mesmo padrão dos mosaicos de Penrose e dos quasicristais.

(Folha de São Paulo)

Cientistas fazem macaco mover e sentir objeto virtual com o pensamento

Pela primeira vez, cientistas realizaram uma comunicação bidirecional entre o cérebro de um primata e uma máquina. Dois macacos com eletrodos implantados no cérebro moveram com o pensamento um cursor na tela de um computador e sentiram a textura - virtual - de objetos.

A descoberta abre portas para a construção de verdadeiros avatares: corpos artificiais ou vestes robóticas que sentiriam e atuariam na realidade comandados diretamente pelo cérebro. "A ação da mente não estaria mais confinada ao organismo humano", disse ao Estado o neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis, líder do grupo que realizou a pesquisa, publicada na Nature.

A nova tecnologia poderá ter aplicações tão diversas quanto ajudar pessoas com paralisia nos membros, explorar lugares distantes e realizar operações em áreas perigosas.

Origem - Em 1999, a macaca Belle, do laboratório de Nicolelis, moveu um braço robótico com o pensamento. O cientista registrou os sinais de 90 neurônios com eletrodos no cérebro da primata. Em 2001, o experimento foi considerado pelo Instituto de Tecnologia de Massachussets (MIT, na sigla em inglês) uma das dez descobertas que influenciarão de forma profunda o destino da humanidade.

Mas algo importante faltava. Para que dispositivos eletrônicos fossem compreendidos como uma extensão genuína do corpo, deveriam "sentir" a realidade e enviar as informações obtidas para o cérebro. Na recente pesquisa, os macacos foram capazes de discernir a textura de objetos virtuais (mais informações nesta página). O experimento abre caminho para que outras informações, como temperatura, possam ser captadas por máquinas e reproduzidas no cérebro humano.

"Esse estudo confirma que o cérebro reconhece as ferramentas como uma extensão do próprio corpo", diz Nicolelis. "Os animais passaram a dispor do corpo virtual como se ele realmente fosse natural, criando uma nova identidade." As interfaces cérebro-máquina fomentam a esperança de um futuro em que será possível restabelecer os movimentos de pessoas com paralisia e, ao mesmo tempo, recriar a sensibilidade perdida do tato.

Ambição - Não é à toa que o experimento faz parte do plano do consórcio internacional Walk Again. Realizado com a ajuda de outros quatro cientistas do Centro de Neurociência da Universidade Duke, nos Estados Unidos, e outros dois da Escola Politécnica de Lausanne, na Suíça, o projeto pretende desenvolver e demonstrar um exoesqueleto externo para devolver o movimento a pacientes quadriplégicos até a Copa de 2014, no Brasil, data marcada para a demonstração mais ambiciosa da tecnologia.

"O pontapé inicial da competição será dado por um jovem tetraplégico. Temos um projeto de seis anos amarrado com o governo federal e outras instituições para divulgar o projeto Walk Again aos demais países", afirma. "Naturalmente, a estratégia envolve a Copa do Mundo e as Olimpíadas do Brasil."

Nicolelis pretende anunciar em breve uma parceria com o governo federal para trazer a última fase do projeto Walk Again para o Câmpus do Cérebro, em Natal (RN), onde está sendo desenvolvido um programa para que tetraplégicos possam treinar com um avatar que imita o corpo humano.

'Ideia é recriar o tato como um sexto sentido' - Segundo Miguel Nicolelis, tecnologia possibilitará que quadriplégicos recobrem sensação táctil com vestes robóticas.

Como a mesma tecnologia testada nos macacos funcionaria em seres humanos?

A ideia é criar um sexto sentido. Ele vai possibilitar que o paciente recobre a sensação tátil ao usar uma veste robótica, podendo identificar o tipo de terreno onde está pisando ou a textura de um objeto que segura com uma mão biônica.

Como a nova descoberta será integrada à veste robótica que pode possibilitar que quadriplégicos voltem a andar?

A veste terá sensores de pressão que criarão um padrão, e esse padrão será traduzido em um estímulo elétrico proporcional à textura dos terrenos ou objetos. Tudo isso é entregue ao cérebro, que funciona como um reconhecedor de padrões e associa à nova sensação. Partindo da mesma lógica, outras pesquisas podem levar à identificação da temperatura, por exemplo, tornando as próteses biônicas mais sensíveis. O nosso experimento provou, pela primeira vez, que é possível criar uma interface cérebro-máquina-cérebro, permitindo o desenvolvimento de um exoesqueleto robótico para que pacientes paralisados possam receber feedbacks do mundo exterior e, com isso, recobrem a sensação tátil através de sensores. Já havíamos feito uma previsão teórica de que isso era possível, mas ainda não havíamos feito uma demonstração que provasse, e isso muda com o estudo publicado na Nature. Vencemos um grande desafio: os estímulos são enviados ao cérebro ao mesmo tempo que registramos a atividade elétrica do córtex. Ao mesmo tempo que os sinais elétricos do cérebro podem controlar o avatar do corpo, o órgão pode receber um feedback do que esse avatar encontra no espaço virtual.

Muda algo no projeto Walk Again e no plano de fazer um tetraplégico dar o pontapé inicial da Copa do Mundo de 2014?

Estou propondo ao governo e já tenho sinalização de que querem participar de um projeto de seis anos para demonstrar o projeto Walk Again para o mundo, na Copa e nas Olimpíadas que serão realizadas no Brasil. Queremos fazer demonstrações gradualmente mais complexas do exoesqueleto robótico que fará um tetraplégico voltar a andar.

Quais os próximos passos para a concretização do projeto?

O governo federal deve anunciar nos próximos dias um apoio para trazermos o projeto para Natal, para o Câmpus do Cérebro. Lá nós já temos um avatar realístico do corpo completo de um macaco, agora teremos de criar um modelo igual para o ser humano. Com ele poderemos treinar os pacientes quadriplégicos a interagir com um avatar do corpo. Será como o Flight Simulator (jogo de simulação e treino para pilotos de avião) do avatar que será usado depois pela pessoa.

(O Estado de São Paulo)

O paredismo nas universidades federais

Artigo de Amilcar Baiardi enviado ao JC Email pelo autor.

Dois movimentos paredistas nas universidades federais, um ocorrido e outro em curso, sugerem uma reflexão do mundo acadêmico, da sociedade civil e da sociedade política. Um deles, a greve nacional dos servidores técnicos administrativos, ultrapassou 100 dias, encerrando-se na semana passada. O outro, paralisação / ocupação, a denominação varia dependendo de onde ocorra, de instalações universitárias, inclusive reitorias, pelos estudantes, tem tido uma duração menor, persistindo em alguns casos, atingindo várias universidades federais, entre elas as seguintes: UFSC, UnB, Ufscar, UFF, UFES, Unifesp, UFMT e UFRB.

No caso da greve nacional dos servidores técnicos administrativos, a pauta do movimento grevista contemplava o cumprimento de um acordo assinado em 2007, um novo piso salarial e, para não se restringir a pleitos meramente corporativos, incluía a rejeição ao Projeto de Lei 1749-C/2011, que propõe a criação da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares S.A., EBSERH, entidade à qual, de acordo com proposta do poder executivo, caberia "implantar um modelo de gestão mais ágil, eficiente e compatível com as competências dos hospitais universitários, além de oferecer solução jurídico-administrativa sustentável que solucione as crescentes dificuldades operacionais e os inúmeros questionamentos do Tribunal de Contas da União e do Ministério Público Federal a respeito do atual funcionamento dessas instituições".

A EBSERH, uma vez criada como empresa pública de direito privado, assumirá a gestão de todos os hospitais universitários, contratará pessoal pelo regime da CLT e os atuais servidores das universidades federais com funções hospitalares, poderão ser cedidos ao novo ente, com ônus para as instituições cedentes. Com a implantação da EBSERH as universidades federais perdem o controle de gestão dos seus hospitais e a autonomia universitária é desconsiderada. No momento o Projeto de Lei já passou pela Câmara de Deputados com emendas que não modificam sua essência e foi encaminhado ao Senado.

Aparentemente a greve dos servidores técnicos administrativos das universidades federais não levou a nenhuma conquista para a categoria. A Fasubra, Federação de Sindicatos de Trabalhadores em Educação das Universidades Brasileiras, promoveu uma saída organizada do movimento, pois, sem acordo, ultrapassou-se o prazo de inclusão de qualquer reajuste salarial pretendido no orçamento da União para o próximo ano. Independente das razões que poderiam justificar uma greve dos servidores técnicos administrativos, como o não cumprimento de acordo pactuado, a rejeição ao Projeto de Lei 1749/2011 parece ser um ponto de pauta a exigir, no mínimo, mais discussão nas universidades, pela amplitude de suas implicações.

O fato é que a grande maioria dos hospitais universitários do Sistema de Instituições Federais de Ensino Superior, IFES, não tem como oferecer serviços de alta complexidade com suas receitas orçamentárias e com a obrigação de atender 40 milhões de pacientes do Sistema Único de Saúde, SUS. Dentre eles, os de melhor desempenho em suas missões são os da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, UFRGS, e da Universidade Federal de São Paulo, Unifesp, o primeiro porque é pioneiro em uma concepção de empresa pública de direito privado, a qual inspira a criação da EBSERH, e o segundo porque é, em parte, mantido, por uma organização da sociedade civil, Sociedade de Amigos do Hospital São Paulo.

A greve nacional dos servidores técnicos administrativos do sistema IFES cometeu um equívoco ao propor um ponto de pauta que diz respeito a interesses acadêmicos e sociais mais amplos, como a rejeição ao Projeto de Lei 1749/2011. A Fasubra, que elaborou a pauta, o fez por razões tipicamente ideológicas: discordar da gestão do patrimônio público por parte de uma empresa. De outro lado, o movimento paredista dos servidores técnicos administrativos das universidades federais conseguiu, indiretamente, provar que a greve desta categoria não paralisou as universidades, que seguiram, com pequenas dificuldades aqui e acolá, seu calendário acadêmico de atividades de ensino, pesquisa e extensão. Isto permite a interpretação de que a alocação de servidores e seu quantitativo no âmbito das universidades federais estão a merecer análise.

Como prêmio de consolação, a Fasubra foi contemplada com um assento no Conselho de Administração da EBSERH, como prevê o artigo nove do Projeto de Lei 1749/2011. Aí cabe a pergunta: por que se deixou de incluir no conselho os sindicatos nacionais dos docentes do sistema IFES? Os professores, promovendo a formação de médicos, enfermeiros, farmacêuticos, nutricionistas etc., tanto quanto os servidores técnicos administrativos, estão também presentes nos hospitais universitários.

A paralisação / ocupação de instalações universitárias, inclusive reitorias, pelos estudantes, o segundo tipo de movimento paredista, é, por sua vez, um movimento com muito maior legitimidade. Reflete o mesmo a insatisfação com precariedades existentes em muitas universidades federais e também é reflexo de expectativas criadas em termos de assistência estudantil, que não se materializaram. Há inúmeras obras paralisadas em quase todas as universidades federais e o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais, REUNI, na sua implantação centrou-se na quantidade de novos cursos e no aumento do número de matriculas. O quadro é tão dramático que conclusões de graduações estão ameaçadas por falta de laboratórios, equipamentos comunitários, hospitais etc., não concluídos.

Diante deste quadro há, paradoxalmente, manifestações díspares por parte de dirigentes universitários. De um lado, em 14 de setembro último, durante a abertura do encontro da Andifes, foro de dirigentes do Sistema IFES, o reitor João Luiz Martins (Ufop), declarou que é impossível pensar numa expansão qualificada da universidade sem pensar na pós-graduação, na pesquisa, na geração de conhecimento e formação de recursos humanos. "Nenhuma expansão pode ser feita sem ter qualidade. Não dá para pensarmos em expansão da graduação sem pensar também na Pós-Graduação" (sic), afirmou João Luiz.

Também em setembro, no dia 13, o reitor Paulo Gabriel Nacif (UFRB), em um evento interno de pós-graduação, pesquisa e iniciação científica declarou que: "construímos a maior autarquia do interior do Nordeste Brasileiro". Nenhuma referência foi feita ao imperativo da qualidade, na ocasião, em que pese a UFRB ser "vice lanterninha" no ranking de qualidade do MEC. Talvez por isso as instalações administrativas da UFRB estejam, há mais de 100 dias, ocupadas pelos estudantes e, em nível nacional, quiçá o descuido do MEC com a excelência universitária, tenha também provocado protestos como as vaias dos estudantes ao Ministro Haddad no dia 18 de setembro último, em São Paulo. Urge refletir sobre o que foi dito pelo reitor da Universidade Federal de Ouro Preto e sobre os nexos entre sua declaração e os movimentos paredistas.

Amilcar Baiardi é professor titular da UFBA e da UFRB e doutor em economia pela Unicamp. Foi professor visitante da Universidade de Aarhus, Dinamarca, e da Universidade de Bolonha, Itália e é membro da Academia de Ciências da Bahia.