Cientistas brasileiros criaram método que estuda a estrutura da conversa.
A forma como alguém conta uma história pode revelar muitas coisas, inclusive transtornos psiquiátricos. Pesquisadores brasileiros criaram um método que consegue identificar pacientes com esquizofrenia e com mania apenas usando a fala.
O trabalho começou a ser desenvolvido em 2006 e, ao longo do tempo, envolveu um time de cientistas de várias especialidades, liderados por uma equipe do Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Os pesquisadores criaram um modelo que transforma em gráficos (grafos) o discurso dos pacientes. E, a partir desse padrão, é possível identificar padrões e correlações que são bastante específicos dessas duas psicoses. No experimento, os cientistas analisaram 24 pessoas, sendo oito delas com diagnóstico prévio de esquizofrenia, oito de mania e oito sem psicoses diagnosticadas.
O Método - O primeiro passo é uma entrevista, na qual se pede que os pacientes contem um sonho. Esse relato é gravado e transcrito. Depois, é aplicado um software usado no estudo dos grafos - área que já é consagrada na psiquiatria - que destaca os pontos relevantes da fala dos pacientes. O programa, além de indicar os pontos de conexão da conversa, apresenta as principais diferenças no discurso dos voluntários.
Os resultados são simples de interpretar visualmente. Os grafos dos pacientes com mania são muito mais densos, com várias idas e vindas em relação ao tema do relato. Em geral, a pessoa "se perdia" mais na conversa, uma característica marcante das pessoas com esse transtorno.
Já os grafos dos pacientes com esquizofrenia são mais retilíneos e seguem uma sequência menos caótica. Os pacientes tendem a falar menos, a ser mais contidos no relato de suas experiências.
"Um psiquiatra treinado é capaz de, em uma conversa longa no consultório, chegar às mesmas conclusões. Esses padrões de discurso já são notados. O que nós criamos agora é uma forma mais rápida e quantitativa de abordar a questão", explica Natália Mota, do Instituto do Cérebro, uma das autoras do trabalho, publicado na "PLoS ONE".
Embora os cientistas tenham conseguido taxa de sucesso no diagnóstico de cerca de 93%, bem maior do que os cerca de 67% das escalas mais usadas pelos psiquiatras, Mota ressalta que o método deve complementar as avaliações usadas atualmente. "Ele não substitui a experiência do consultório."
O neurocientista Sidarta Ribeiro, que também participou do trabalho, vê um grande potencial no método. "Por enquanto, nós analisamos apenas a forma com que as coisas foram ditas. A questão semântica ainda não entrou nesse trabalho. Mas nós já começamos uma próxima etapa, que vai juntar tudo isso. Estamos trabalhando para aperfeiçoar essa ferramenta", diz o cientista.
quarta-feira, 11 de abril de 2012
Waldir L. Roque - Ciência sem Fronteiras
Ciência sem Fronteiras, programa recém criado pelo governo federal, visa estimular nos universitários o interesse pela ciência e pesquisa, concedendo bolsas de estudo em universidades de excelência no Exterior. Como proposta, o Ciência sem Fronteiras parece útil, mas é importante chamar a atenção para alguns fatos. Ao regressar de uma visita curta a uma universidade de excelência, além de o estudante de graduação não ter obtido uma formação muito superior à oferecida no Brasil, ele verá o grande contraste nas condições de trabalho, ensino e pesquisa entre a instituição estrangeira e a brasileira, o que pode ser desestimulante e até levá-lo a retornar à instituição no Exterior. Neste caso, a perda será muito maior, pois o estudante que vai para o Exterior, após um curso de graduação ou pós-graduação no Brasil, representa custo zero para o país que o absorve, além de ingressar no mercado de trabalho na sua fase mais produtiva. O estímulo aos estudantes brasileiros passa por boas condições de ensino e pela infraestrutura disponível nas instituições brasileiras, mas aqui encontramos muitas barreiras. As universidades públicas não oferecem boas condições de trabalho aos docentes, incluídas aí questões salariais e da carreira docente. O custo do Ciência sem Fronteiras está estimado em R$ 3,6 bilhões para quatro anos, enquanto o recurso do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação foi reduzido em 22% nos últimos dois anos – um corte de R$ 2,6 bilhões. Os Estados Unidos, mesmo em crise, aumentaram em 2,5% o orçamento da Fundação Nacional de Ciências, órgão equivalente ao CNPq, e a China, um dos países do Brics, ampliou o orçamento em 12,4%. Os cortes brasileiros representam mais uma barreira para o desenvolvimento científico/tecnológico do país. A pesquisa no Brasil é essencialmente realizada nos programas de pós-graduação das universidades públicas, mas esses ainda são herméticos e endógenos. A língua portuguesa é uma barreira natural para atrair estrangeiros a cursarem aqui mestrado e/ou doutorado e ingressarem no mercado de trabalho brasileiro. Tal barreira poderia ser minimizada possibilitando-se a oferta de cursos e a apresentação de dissertações e teses em inglês. São inúmeras as barreiras a serem eliminadas antes de termos, de fato, um Ciência sem Fronteiras capaz de promover o desenvolvimento pleno da ciência, tecnologia e inovação do país.
Waldir L. Roque *PROFESSOR DO INSTITUTO DE MATEMÁTICA DA UFRGS
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